terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Leishmaniose Visceral (Calazar)

Quem mora em área em Crateús já sabe o desafio que é manter seu cachorro livre da leishmaniose, ou calazar. Esta é uma doença de ocorrência bastante comum na população canina de nossa cidade, com eventual registro de casos também em humanos. Outro ponto importante ligado a esta doença é a polêmica: o conflito de interesse (não sei se bem interesse, mas talvez, divergências filosóficas e procedimentos) entre os proprietários, médicos veterinários, pesquisadores, Ministério da Saúde acabam polemizando esta doença. Nesta postagem vou tentar expor da forma mais neutra possível a doenças e os diferentes posicionamentos que acercam para que cada um possa, de forma consciente, tirar suas próprias conclusões.
A doença: a leishmaniose visceral, ou calazar, é uma doença sistêmica grave, de curso lento e crônico que acomete principalmente canídeos domésticos e  selvagens e, eventualmente, o homem. è também detectada em alguns roedores (como o rato) e outras espécies animais. É provocada pelo protozoário Leishmania chagasi, e transmitida através da picada do mosquito Lutzomyia longipalpis (também conhecido como mosquito palha).

Macrófago infectado pela L. chagasi
A doença ocorre quando um mosquito infectado pica um animal injetando o protozoário Leishmania chagasi no seu sangue. Após a infecção, o parasita infecta um grupo de células chamadas de macrófagos (que fazem parte do sistema de defesa do organismo). Estas células, que a princípio deveriam destruir os parasitas, acabam servindo de local para a reprodução do mesmo e, neste processo, acabam sendo destruídas liberando mais parasitas na corrente sanguínea do animal. Desta forma e com a progressiva multiplicação do número de parasitas diversos órgãos acabam por serem afetados, especialmente baço, fígado, rins, pele, medula óssea dentre outros órgãos e tecidos.

Lutzomyia longipalpis
O mosquito, por sua vez, se infecta ao ingerir o sangue de animais doentes, pela ingestão ou de parasitas livres ou ainda de macrófagos contaminados. Após um período, em que os parasitas sofrem algumas transformações e novos ciclos de multiplicação no mosquito, migram para suas glândulas salivares e pronto, o ciclo de transmissão está completo.

Os sintomas: Os sintomas de leishmaniose canina são muito vaiáveis. Diversos estudos apontam que a grande maioria dos animais, em torno de 57 a 62%, são assintomáticos (não apresentam nenhum sintoma) outros são oligossintomáticos (apresentam sintomas leves ), e apenas uma minoria apresenta sintomatologia severa. este fato causa muitas vezes o susto em proprietários de animais aparentemente saudáveis que acabam demonstrando resultados positivo a testes sorológicos.
Cão com sintomatologia de calazar
De um modo geral os animas doentes podem apresentar alguns dos seguintes sintomas:
- Aumento do nódulos linfáticos (ínguas);
- cansaço;
- perda de peso;
- perda de massa muscular;
- febre;
- diminuição do apetite;
- aumento do fígado;
- secreção nasal;
- feridas ma pele;
- descamação;
- hemorragia nasal (às vezes o animal espirra sangue);
- lesões oculares;
- crescimento das unhas.
Porém como dito anteriormente, muitos animais não apresentam nenhum sintoma!

O diagnóstico: Em virtude da grande variedade de sintomas a leishmaniose visceral é uma doença que às vezes apresenta um grande desafio diagnóstico por meio da clínica. Um clínico experiente terá uma grande suspeita nos casos mais característicos, porém o diagnóstico definitivo é determinado pela realização de exames laboratoriais específicos.


O tratamento: Este é certamente o ponto mais polêmico em relação à leishmaniose visceral canina. Em primeiro lugar, deve-se ter em mente que apesar da cura clínica o animal não fica totalmente livre do parasita, que persiste ainda na medula óssea do animal. O tratamento exige um grande compromisso por parte do proprietário do animal, um contínuo acompanhamento  veterinário e pode perdurar por toda a vida do animal. Mas então, qual a grande polêmica? No Brasil, o tratamento de animais positivos para a leishmaniose é proibido, sendo definido  que estes animais devem ser eutanasiados (portaria interministerial nº 1426/2008). 
Neste ponto faço uma manifestação pessoal. Acho lamentável a culpa imposta aos cães, como se estes fossem os únicos responsáveis pela doença. Na verdade a leishmaniose está muito relacionada a condições inadequadas de higiene e saneamento nas cidades, às péssimas condições de moradia, à má alimentação da população, à posse irresponsável de animais. Concordo que não são todos os animais doentes que são candidatos ao tratamento, cada caso é um caso, porém discordo que a única política pública seja pautada exclusivamente em identificar animais positivos e eliminá-los (muitas vezes de forma desumana). 


Prevenção: A prevenção da leishmaniose pode ser feita pela utilização de vacina, coleira repelente, utilização de telas nos canis, plantação de vegetais repelentes (como é o caso da citronela) próximo aos canis, manutenção de ambiente limpo, evitar passear com seu animal ao anoitecer e ao  ao amanhecer, quando o mosquito é mais ativo. Pode se forma adicional, porém com maior risco de contaminação para seu animal, fazer aplicação de inseticidas no ambiente e principalmente procure se informar. Procure um veterinário de sua confiança tire suas dúvidas e lembre-se de levar seu animal regularmente ao veterinário.


Juracir Bezerra Pinho
Médico Veterinário




Fotos:
http://www.saudeanimal.com.br/imagens/leishmania.jpg
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/1/17/Phlebotomus_pappatasi_bloodmeal_begin.jpg/220px-Phlebotomus_pappatasi_bloodmeal_begin.jpg
http://www.liv.ac.uk/researchintelligence/issue18/images/W046387R.jpg

2 comentários:

  1. Olá,Dr. Juracir.Em primeiro lugar,parabéns por seu artigo!Bom,como o Sr.bem disse,a culpa não é dos cães.Mas,infelizmente,o que percebo aqui em Crateús é que se tem combatido mais os cães do que os mosquitos.Vejo muito a realização de campanhas de exames e recolhimento dos cães "supostamente doentes" para sacrifício-uma verdadeira caça aos cães e não aos mosquitos!E isso tem diminuído a infestação do mosquito?Duvido,afinal o cachorrinho(que não é o verdadeiro culpado,como o Sr. e eu concordamos) se vai e o verdadeiro culpado(A PESTE DO MOSQUITO)fica!Dr. DEVEMOS COMBATER O MOSQUITO!VENENO NELES,campanhas educativas mais CONTÍNUAS,na minha opinião,são o caminho!Lamento viver na minha cidade,que tanto gosto,e não poder criar meu cachorrinho em paz...É minha sincera opinião.Ass.:Henrique Bezerra Rodrigues

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    1. Quando falamos de mosquito, mau caro Henrique, temos uma gama muito grande de barreiras. Tomemos por exemplo a dengue, cujo o vetor (A. aegypti) tem seus criadouros de fácil identificação e controle, e no entanto, apesar da grande quantidade de veneno já utilizada ainda hoje é uma problema de saúde pública. Desafio muito maior um vetor que é de origem silvestre, e que se multiplica no solo, como é o caso dos Flebotomíneos. É evidente que outras ações devem, e precisam ser implementadas, como o controle populacional (campanhas de esterilização) a utilização de coleiras nos cães, vacinação animal, orientação sobre posse responsável, saneamento básico, destino adequado do lixo dentre outras, mas sinceramente, pensar em combater o mosquito, hoje pode ser considerado utópico. Não é culpa dos veterinários que trabalham com saúde pública quando um animal adoece. Infelizmente alguns proprietários não se conformam e acabam jogando sobre estes profissionais uma culpa que não lhes pertence. Quando um profissional busca orientar conforme sua consciência, seja para o tratamento ou para a eutanásia, esteja certo que cada um atua, ou deveria, atuar visando o melhor para o animal ou para a saúde pública, e não apenas na venda de uma "cura", como fonte de venda de produtos e medicamentos. Eu mesmo já vi animais que foram "tratados" com resultados desastrosos para o animal, bem como já tive a lamentável experiência de ver uma criança infectada a qual posteriormente veio a óbito. Não vejo "Tacar veneno" como uma solução, se o fosse, não teríamos mais dengue no Brasil. Infelizmente é esta a realidade em que vivemos. Temos que lutar para mudá-la, isto é claro, mas de forma técnica e não apenas levados pelos impulsos.

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